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Geometria Hiperbólica
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Hiperbólica
Préfacio
O surgimento da
geometria hiperbólica é com certeza um dos capítulos mais interessantes da
história da matemática. Durante séculos a matemática (e os matemáticos)
ficaram intrigados com o enunciado do 5o Postulado de Euclides
"Se uma linha reta atingindo outras duas linhas retas faz os ângulos
interiores de um mesmo lado da linha menores que dois ângulos retos, as
duas linhas retas, se estendidas indefinidamente, se encontram daquele
lado da linha no qual os ângulos são menores do que dois ângulos retos".
Tanto devido ao contraste deste enunciado original com a clareza com que
foram enunciados os outros postulados, como devido ao fato de Euclides
evitar o máximo possivel fazer uso deste postulado na demonstração das
proposições, suspeitou-se durante dois mil anos da independência deste
postulado, ou seja, imaginava-se que este fosse apenas uma proposição que
pudesse ser demonstrada utilizando-se os outros postulados. Ao longo dos
séculos, diversos enunciados equivalentes ao 5o. Postulado foram feitos, o
mais popular de todos sendo o de John Fairplay (1748-1819): Por um ponto
não contido em uma reta dada, pode ser traçada uma e apenas uma reta
paralela a reta dada. Este enunciado acabou batizando o 5o. Postulado com
o nome de Postulado das Paralelas. Durante o século 18 diversos
matemáticos, tais como Girolomo Saccheri e Johann Heinrich Lambert
tentaram demonstrar o 5o. postulado. Apesar de não serem bem sucedidos em
seu intento (o que não nos surpreende hoje em dia, pois sabemos ser um
postulado realmente independente), conseguiram diversos e importantes
avanços. Foi provado, por exemplo, que sem o Postulado das Paralelas,
obtem-se que a soma dos ângulos internos de um triângulo pode ser maior ou
menor do que p. A falta ou excesso (a diferença entre a soma dos ângulos
internos e p) depende da área do referido triângulo, de modo semelhante ao
que ocorre em uma esfera. Apenas na primeira metade do século 19,
começou-se a suspeitar que o Postulado das Paralelas fosse realmente
independente dos demais.da independência do Postulado das Paralelas.
Matemáticos como Carl Friedrich Gauss (1777-1855), János Bolyai
(1802-1860) e Nicolai Lobatchevsky (1793-1856) trataram da questão ao
considerar três situações distintas: Por um ponto não contido em uma reta
dada, passa mais de uma, apenas uma ou nenhuma reta paralela a reta dada.
Por suspeitarem da independência do Postulado das Paralelas, ou seja, de
que sua negação poderia gerar uma geometria consistente, sem contradições,
desenvolveram de forma axiomática um estudo amplo e detalhado de uma
geometria que assumia a existência de mais de uma reta paralela (a
terceira hipótese, da inexistência de retas paralelas pode ser descartada,
conforme vremos mais adiante), criando o que veio a ser chamada com o
tempo de Geometria de Lobatchevsky ou Geometria Hiperbólica. No entanto,
as dúvidas referentes a consistência desta nova geometria, só foram
dirimidas no final do século, quando matemáticos como Eugenio Beltrami,
Henri Poincaré e Felix Klein criaram modelos euclidianos para esta
geometria. A criação de modelos euclidianos para a geometria hiperbólica
resolve a questão da consistência desta geometria, pois qualquer eventual
contradição a ser encontrada implicaria em uma contradição existente na
geometria euclidiana, ou seja, as geometrias hiperbólica e euclidiana tem
o mesmo grau de consistência (uma descrição detalhada sobre a equivalência
entre a consistência destas duas geometrias pode ser encontrada em
Po1). Este texto esta dividido em três seções. Na primeira
delas apresentamos os axiomas da geometria neutra e alguns resultados
decorrentes destes axiomas. Por geometria neutra entendemos todos os
resultados e construções que podem ser feitos prescindindo de qualquer
versão do Postulado das Paralelas, seja em sua versão euclidiana ou em sua
versão hiperbólica. Os axiomas que iremos apresentar são equivalentes, e
bastante similares aqueles adotados por David Hilbert em seu famoso
Grundlagen der Geometrie (Hi). Na segunda seção introduzimos
o Axioma Hiperbólico das Paralelas e desenvolvemos uma série de resultados
que podem a primeira vista causar certa estranheza, enfatizando a
importância do Axioma das Paralelas. Não se preocupem com esta sensação,
inúmeros matemáticos, incluindo C.F. Gauss, aparentemente passaram por
este mesmo processo. Aos leitores interessados em se aprofundar no estudo
axiomático de geometria hiperbólica, sugerimos os livros de Roberto Bonola
( Bo) e Luiz Fernando C. da Rocha (Ro). Em
particular, citamos o excelente texto de Ramsay e Richtmyer
RaRi, que trata da questão de consistência e categoria dos
axiomas hiperbólicos. Na terceira e última seção apresentamos dois modelos
para a geometria hiperbólica, conhecidos como disco de Poincaré e o
semi-plano de Lobatchevsky. Realçamos que a palavra modelo é empregada
aqui no sentido pleno do termo, ou seja: qualquer afirmação que seja
provada a partir de algum modelo, pode ser demonstrada a partir do corpo
de axiomas da teoria. Em outras palavras, sob o ponto de vista de
conteúdos, nada perdemos ao trabalharmos diretamente com os modelos, sem
fazermos menção à estrutura axiomática. A grande vantagem de se trabalhar
com modelos é a possibilidade de desenvolvermos uma percepção bastante
refinada sobre a geometria em questão. Os modelos exercem para a geometria
a mesma função que um bom atlas exerce para a geografia: apesar de os
mapas apresentarem distorções, estas são quantificáveis e razoavelmente
"bem comportadas", de modo que podemos nos situar de forma bastante
satisfatória apenas através de nossos mapas. Mais detalhes sobre geometria
hiperbólica, explorando os modelos de forma exaustiva, podem ser
encontrados nos textos Be ou Fi.
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Hiperbólica
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